Confira abaixo a entrevista que o Eminem fez para o portfólio da GQ
EMINEM
Ele criou o famoso verso em que você somente tem uma oportunidade, e ele
batalhou para isso – contra pobreza, abuso e racismo – para se tornar o rapper
mais reconhecido dos últimos tempos. Depois ele tentou destruir a si mesmo,
somente para retornar, sim, através de uma segunda oportunidade – e coroado
novamente: o artista que mais vendeu na era contemporânea. Talvez seja hora de
reescrever aquela música e Marshall Mathers está sentando em seu escritório na
parte de trás do seu estúdio de gravação, enorme por sinal, onde trabalha toda
semana, batalhando duro ainda. Ele se apresenta de forma simples, como
faz no palco – nada de roupas que chamem a atenção ou jóias em excesso, apenas
uma camisa cinza, bermuda, um boné estilo militar, e um cordão com uma pirâmide
de diamante. Ele carrega uma garrafa de água e uma lata de Red Bull na mão.
O rapper mais conhecido como Eminem tem hoje 39 anos. Que ele é engraçado isso
não deve te chocar – seus raps sempre contiveram um pouco de humor negro – mas
o fato dele se manter inexpressivo e nunca demonstrar um sorriso faz você
pensar que você esta perdendo alguma piada que ele esta fazendo. Que ele
é um grande fã do hip-hop – um dos maiores nerds na área do rap que já conheci
– também não deve ser surpresa para você. Musica foi a sua salvação. Ele é,
apesar de tudo, o garoto branco que criou no rap a sua própria imagem
oferecendo um caminho correto para os garotos como ele. Ocorre, que há milhões
desses garotos(as) lá fora. E eles ainda permanecem lá. Seu álbum mais recente,
“Recovery”, foi o álbum mais vendido em 2010 e questionam-se se não foi o
melhor trabalho de sua carreira.
A narrativa envolve-se em torno do atual Sr. Mathers e seu triunfo sobre seu
vício contra medicamentos controlados. O assunto não lhe causa nenhum pouco de
embaraço: em minutos ele entra no tópico, explica como ele bebia e tomava
pílulas para poder realizar seus shows. “Eu sou uma criatura de hábitos,” ele
diz tomando um pouco de Red Bull. “Se eu estou acostumado a levantar de manhã
tomar um desses aqui, eu posso fazer isso toda manhã pelos próximos dez
anos direto, até que eu ache outra coisa para substituir. Então se eu me
acostumei a tomar Vicodin quando eu acordava de manhã porque eu acordei de
ressaca de álcool ou tomar pílulas...” ele pausa. “Quanto maior era a platéia,
maior meu vicio se tornava”.
Mathers disse que você pode obcervar o traço de seu vício escutando seus
álbuns: ele estava mais ou menos sóbrio quando gravou The Slim Shady LP (1999);
ele da crédito a algumas drogas por levá-lo a lugares desconhecidos durante o Marshall
Mathers LP(2000); com o The Eminem Show ele alcançou a balança
perfeita algumas linha poderosas de rap intensificadas com o drama de sua
biografia. Mas ai a balança caiu: Em seu quarto álbum Encore, foi o seu ponto
mais baixo, ele demorou dois anos para fazê-lo por conta de seu vicio em
remédios. “Cinco ou seis musicas vazaram do original Encore”, ele diz. “Então
eu tive que voltar e fazer novas musicas para substituí-las. Na minha cabeça eu
estava puto: ‘Oh bem as musicas vazaram. Foda-se. vou tomar mais um pouco
dessas pílulas e ir lá e fazer a festa comigo mesmo’. Quanto mais pílulas eu
tomava, mais idiota eu ficava.”
Ele é um pouco vago sobre essa época, quando ele estava tomando, por conta
própria, algo em torno de sessenta a noventa pílulas por dia, incluindo Valium,
Vicodin, Ambien e Seroquel (usado para tratamento de esquizofrenia). “Ambien”,
ele diz “comeu boa parte de meu cérebro”. Ele disse que entrou em um programa
de reabilitação em 2005, mas não afirmou com veemência. Como disse, foi um
pouco vago.
As clinicas de reabilitação não eram um lugar seguro para Eminem. “Olha” ele
diz, “todo viciado em tratamento acha que todos estão encarando ele. Comigo? Todosestavam
me encarando. Eu nunca estava confortável. Algumas pessoas me tratavam
normalmente. Mas havia um grupo de idiotas que não se concentravam na sua
reabilitação porque estavam preocupados com o meu tratamento. Eles roubavam
meus bonés, meus livros – era um caos. Tudo era um drama naquele lugar. E na
época, eu não queria ficar sóbrio. Todos queriam que eu ficasse. E todos me
diziam: se você não está pronto nada vai mudar você. Amor... nada”.
Ele deixou a reabilitação muito chateado e sobrecarregado e começou as tomar as
pílulas novamente. Isto quase o matou. “Eu acordei no hospital e não sabia que
merda havia acontecido” ele diz. “Havia tubos em mim, agulhas em meu braço e
toda essa parada. Eu não tinha percebido que tinha sofrido [overdose]. Eu
queria minhas drogas de volta – me tirem dessa porcaria de lugar! Eu acho que
fiquei sóbrio por umas duas semanas. Eu estava tentando de verdade – tentando
pelas minhas filhas – mas eu simplesmente não estava pronto”.
O que o levou a buscar tratamento antes de um segundo ataque não foram suas
filhas ou seu coma ou mesmo o hip-hop. Desta vez ele realmente achou que ia
morrer. “Eu senti algo em meu braço muito estranho, cara” ele diz. “Aquilo
realmente me apavorou. Então eu procurei umas pessoas de minha confiança e
disse ‘Olha, eu sei que eu preciso de ajuda. Eu estou pronto agora’. Eu peguei
um quarto no mesmo hospital que tive a overdose, e me desintoxiquei lá”.
Ele sobreviveu a isto e se perdeu na música novamente, da mesma forma de quando
ele tinha 12 anos quando se mudava de escola para escola. “Eu sou esse garoto
tímido,” ele lembra. “Se eu for jogado em uma sala com um grupo de pessoas que
não conheço, eu levanto meu escudo e eu estou preocupado porque meus sapatos
são sempre ferrados e porque eu sempre vestia roupas doadas pelo Exercito da
Salvação, e esses garotos atrás de mim fazendo comentários e sussurrando e eu
não sei se realmente eles tão falando sobre as minhas roupas mas eu sinto que
eles estão falando de mim, e do meu corte de cabelo. Eu não sei como me
defender, porque eu nunca tive uma figura paterna que me desse confiança ou
conselhos. E se você é sempre o garoto novo, você nunca tem a chance de se
adaptar, então sua confiança é zerada. Você é jogado aos lobos. Quando eu vi o
N.W.A falando ‘Foda-se’ para a policia e para todos – ‘Foda-se aquele que
duvidar de mim’ – eu pensei, que merda eu quero falar isso.”
Rappers não deveriam expor seus sentimentos, muito menos admitir que enfrentam
batalha com vício ou que buscou uma ajuda profissional, mas se você já ouviu
alguma coisa sobre o Eminem falando sobre sua mãe, ex-mulher e seu ódio
interno, você sabe que Mathers construiu sua carreira falando sobre assuntos
pessoais.
“A coisa que a sobriedade mais me ensinou é como eu estou conectado – porque meus
pensamentos se processam de maneira diferente”. Ele está falando sobre
suas obsessões, a forma de como ele é ligado a rotina. “Eu percebi que posso
ajudar com a música. Pensamentos esporádicos surgem em minha mente e que tenho
e escrevê-los logo e a próxima coisa que você sabe é que escrevi uma música
inteira em apenas uma hora. Mas as vezes é uma merda, e eu desejaria funcionar
como uma pessoa normal e poder sair para beber. Mas essa é a grande coisa sobre
o vicio: quando você descobre que você não pode – pelo amor de Deus, você não
pode – se meter com nada disso novamente. Eu nunca entendia quando as pessoas
diziam que isso era uma doença. Era tipo ‘Pare com isso, seu puto. Isso não é
uma doença!’ Mas eu finalmente percebi, porra cara, é realmente uma doença”.
O primeiro álbum que Mathers fez após ficar limpo foi Relapse, em 2009,
cinco anos depois de Encore, o período mais longo de sua carreira de 12
anos sem lançar absolutamente nada. Ele estava se sentindo vertiginoso e
entusiasmado depois de se libertar do que ele chama de jaula do vício, e o
álbum não saiu muito bem. Ele recebeu muitas criticas sobre as linhas e atos
bobos (como o sotaque do oriente médio). Enquanto gravava Recovery 2010,
“Eu ouvia as pessoas falando isso ou aquilo sobre Relapse,” ele disse. E isso
realmente o afetou. “Claro que eu não sentava na frente da internet o dia
inteiro e lia o que Sam de Iowa tinha para falar sobre mim. Mas eu absorvo as
coisas. Eu sempre absorvi as coisas”.
E o que Mathers absorveu foi colocado em Recovey, ele precisava voltar a
ser quem ele era – o lutador solitário procurando respeito. “Em um nível
emocional, eu queria que minha música se conectasse com o garoto que eu era.
Então era tipo: ‘Ok, me deixe levar isso a serio. Porque eu sinto que estou
sendo apagado agora e eu estou nas minhas últimas agora’. Eu me sentia oprimido
novamente”.